segunda-feira, 14 de março de 2011

CÁRCERE DE ALTA SEGURANÇA INHUMANIDADE, REPRESSÃO E REBELDIA


Não é mais somente o corpo, é a alma. À expiação que causa estragos no corpo deve acontecer um castigo que aga em profundidade sobre o coração, o pensamento, a vontade, as disposições”

Michel Foucault, “Vigiar e Punir”

A prisão política é um dos recursos de que dispõe o poder para reprimir a dissidência, especialmente aquela que se levanta contra o seu monopólio da força. O confinamento dxs opositorxs existe desde que a sociedade se divide em classes. Os castigos mais comuns para esmagar qualquer expressão organizada capaz de questionar a dominação dos proprietários do capital foram o genocídio, o crime político, os longos confinamentos carcerários, a relegação, o exílio e a contenção.

CAÇA AXS REVOLUCIONÁRIXS: ANIQUILAR CORPOS E IDÉIAS

O Cárcere de Alta Segurança (CAS) do Chile foi construído durante a chamada “transição à democracia”, período de continuidade do modelo econômico neoliberal, a permanência da institucionalidade ditatorial e a impunidade com os dos direitos humanos. Os governos sucessivos da concertação combateram a dissidência social e o agir político militar das organizações rebeldes, aplicando a lei de segurança interior do estado -amplamente utilizada pela ditadura militar- mas desta vez a “enriqueceram com o conceito de segurança cidadã, melhor adaptado às condições do período pós-ditadura. Começando assim um tortuoso (até hoje) processo de “pacificação”, amparado por uma campanha comunicacional que justifica sua estratégia. A utilização freqüênte nos meios de comunicação de conceitos como “delinqüênte terrorista”, ou “delinqüênte subversivo” procura estimular a adhesão e simpatía da sociedade aos procedimentos policiais e dar aval ao castigo exemplificador que se propõe para xs sobreviventes.

O CASTIGO PARA XS SOBREVIVENTES

A construção do Cárcere de Alta Segurança (O CAS) no governo Aylwin construiu-se na Av. Pedro Montt – muito perto do centro de Santiago -. Foi no começo do ano 1993, os presxs “comúns” da confinada ex penitenciária puderam ver desde suas celas os progressos da maquinária pesada que construía um recinto penal que foi considerado inédito na história penitenciária do país.

Para o design, o ministro de justiça, Francisco Cumplido y o ministro do interior, Enrique Krauss, tiveram a assessoria de especialistas de recintos penais especiais para “terroristas”, a polícia espanhola e os serviços de inteligência secretos italiano e alemão. Tal design foi inspirado, segundo eles, nas “experiências recolhidas na Inglaterra, irlanda, Alemanha e Itália”. O que não disseram é que a experiência Eurpeia tinha demonstrado que esse tipo de estabelecimentos penais “…gerava 2 condutas associadas, o suicídio e o enlouquecimento, como tinha ocorrido em Irlanda e na prisão de Stammheim en Stuttgart com militantes do IRA e da RAF1, respectivamente”, produto do isolamento ou a chamada “tortura branca” que priva x prisioneirx de toda experiência sensorial.

O governo da concertação concebeu para xs presxs polítcxs uma prisão na qual se aplicaria um regime disciplinário especial, baseado na segregação interna e externa. Uma prisão que incorporou os fundamentos teóricos e o design estrutural do panóptico e os úlitmos avanços da criminología e do castigo carcerário, que teve como propósito destruir ao/à prisioneirx políticx, isolando-x de seu entorno familiar, social e de suas organizações. É desde o 1º momento, que xs presxs políticxs enfrentaram à prisão com seus próprios corpos, mas também com ideias. Criminalizadxs pela campanha de difamação orquestrada pela mídia.

O CAS sería então, o lugar preservado para xs que, na década de 80 e nos 90 tinham participado em ações armadas, isto é, para aqueles que militavam em grupos ou movimentos revolucionários “não renovados”, “não pacificados”, “intransigentes”, “rebeldes”, “subversivos”, “extremistas”.

Ainda hoje, no ano 2011 o CAS tem como objetivo o extermínio dxs presxs através do esquecimento, da criminalização de suas organizações, um castigo exemplar e sem perdão possível para o “terrorista” e seu aniquilamento físico e mental.


Hoje em dia tem várixs companheirxs libertárixs seqüêstrados:

Mónica Caballeros: EM GREVE DE FOME (desde o 21 de fevereiro de 2011); Seqüestrada no C.P.F., no SEAS, cumprindo prisão preventiva de 180 dias.

Andrea Urzúa: EM GREVE DE FOME (desde o 21 de fevereiro de 2011); Seqüestrada no C.P.F., noSEAS, cumprindo prisão preventiva de 180 días.

Pablo Morales: Seqüestrado no M.A.S. do C.A.S. Cumprindo prisão preventiva de 180 dias, formalizado por associação ilícita.

Rodolfo Retamales: EM GREVE DE FOME (desde o 21 de fevereiro de 2011); Seqüestrado no M.A.S. Cumprindo prisão preventiva de 180 dias, formalizado por associação ilícita.

Vinicio Aguilera: EM GREVE DE FOME (desde o 21 de fevereiro de 2011); Seqüestrado no M.A.S. do C.A.S. Cumprindo prisão preventiva de 180 dias, formalizado por associação ilícita.

Felipe Guerra: EM GREVE DE FOME (desde o 21 de fevereiro de 2011); Seqüestrado no M.A.S. do C.A.S. Cumprindo prisão preventiva de 180 dias, formalizado por associação ilícita.

Carlos Riveros: EM GREVE DE FOME (desde o 21 de fevereiro de 2011); Em “liberdade” mas com medidas cautelares, formalizado por associação ilícita.

Camilo Pérez: EM GREVE DE FOME (desde o 21 de fevereiro de 2011); Seqüestrado no M.A.S. do C.A.S. Cumprindo prisão preventiva de 180 dias, formalizado por associação ilícita.

Francisco Solar: EM GREVE DE FOME (desde o 21 de fevereiro de 2011); Seqüestrado no M.A.S. do C.A.S. Cumprindo prisão preventiva de 180 dias, formalizado por associação ilícita.

Omar Hermosilla: EM GREVE DE FOME (desde o 21 de fevereiro de 2011); Seqüestrado no M.A.S. do C.A.S. Cumprindo prisão preventiva de 180 dias, formalizado por associação ilícita.

Cristián Cancino: Em “liberdade” mas com medidas cautelares.

Diego Morales: Em “liberdade” mas com medidas cautelares.

Candelaria Cortez: Em “liberdade” mas com medidas cautelares.

Iván Goldenberg: Em “liberdade” mas com medidas cautelares.

C.P.F.: Centro Penitenciário Feminino
S.E.A.S.: Seção de Alta Segurança
C.A.S.: Cárcere de Alta Segurança

M.A.S.: Módulo de Alta Segurança

Medidas Cautelares: Obrigação de permanecer no país, proibição de comunicar-se entre si, assinatura semanal, proibição de visitar xs detentxs e de se aproximar aos centros sociais e okupas invadidas, vasculhadas e interditadas pelas autoridades.

Para elxs a mídia criou o conceito de “delinqüente terrorista” ou “delinqüente subversivo”.

O CAS se construiu no interior da penitenciaria, é uma prisão no interior de outra prisão invisível ao olhar do transeúnte que passa adiante de suas altas muralhas. Uma prisão que está longe da sociedade, não tanto por sua distância física, mas pela vontade de ocultamento e da invisibilidade -”habitamos um lugar paradoxal, um lugar sem lugar reconhecido, um ponto invisibilizado e, por sua vez, exemplar. Um modelo de túmulo e monumento que no final acabou sendo um grande cubo de cimento”2.

Isto é, para xs que estão alí recluídoxs, significa estar marginalizadx totalmente da sociedade por meio do esquecimento, do silêncio, do isolamento extremo. “Desde o ponto de vista arquitetônico, esta prisão é o contrário a uma prisão comum. O CAS não se vê, é uma prisão invisível... esta prisão está no ventre do ventre, isto é, está absolutamente oculta aos olhos da sociedade, porque seu objetivo é a desaparição no esquecimento das pessoas que alí se encontram. Os delitos cometidos pelxs que estão dentro não podem ser perdoadxs, não há lugar alí para o perdão, não há lugar alí para um vínculo com a sociedade, sua finalidade é o aniquilamento total e absoluto dos réus e incentiva, além do mais a ausência da possibilidades de reinserção. Isso quer dizer, que no Chile, é muito mais perigoso um “terrorista” -como normalmente se qualifica a uma pessoa que está no CAS-, que um estuprador ou um pedófilo, esta prisão foi pensada para destruir a imagem rebelde e subversiva de um grupo de jovens consideradxs como xs mais perigosxs do país3

Assim, sabe-se que toda prisão tem o triplo objetivo de: Prender, punir e aniquilar.


Uns castigos menos imediatamente físicos, certa discreção na arte de fazer sofrer, um jogo de dores mais sutís, mais silenciados e despojados de seu fasto visível”


Michel Foucault, Vigiar e Punir

Este recinto, dependente da gendarmeria do Chile, entrou em funcionamento no 20 de fevereiro de 1994, mas o decreto que o criou no 25 de fevereiro de 1994 foi publicado somente no 10 de maio do mesmo ano.

Toda a circulação interna está controlada através das grades e portas operadas por funcionários ou por dispositivos eletrônicos e câmeras de circuitos fechados de TV que dominam todo o trajeto dos corredores e pontos-chave. Este mesmo tipo de câmeras se localiza nos refeitórios, pátios e corredores de todos os andares. A isso se associa a presença permanente dos funcionários internos da gendarmeria, e casinhas de controle e vigilância localizadas na saída de cada módulo, vidros polarizados, portões elétricos e segregação” (descrição dxs presxs do CAS).

O cárcere de Alta Segurança tal como está concebido, não visa a rehabilitação mas a destruição psiquica dxs que estão alí confinadxs por ser consideradxs altamente perigosxs ou como se pode dizer: não aptos para ser reintegrados na sociedade.4

Porém, o rigoroso sistema disciplinário da CAS não os aniquilou, porque “na comunidade de presxs políticxs existem certos padrões de existência que lhes permite resistir. Isto é, sua resistência está ligada diretamente com o que chamamos de práticas de evasão... que ajudam de certa forma a anular o objetivo da construção bem pensaba para este recinto5.

Xs presxs políticxs, além de terem sobrevivido às duras condições do CAS por ter resistido cotidianamente ao confinamento, pois desenvolveram afetos e habilidades, mas acima de tudo, porque se reconhecem como parte do continum histórico das lutas dxs oprimidxs. Questionando a vontade de extermínio e os mecanismos “normalizadores” do governo, sobre a base de que a prisão política é a expressão mais acabada da normalização social”.


APELAMOS A QUE A SOLIDARIEDADE ULTRAPASSE OS MUROS DO CAS E AS FRONTEIRAS!!

Presxs a la calle… abajo los muros de las prisiones!


TEXTO ELABORADO A PARTIR DO LIVRO “CARCEL DE ALTA SEGURIDAD” DA JORNALISTA VICTORIA ZAPATA, EDITORIAL MARE NOSTRUM. CHILE.

RESUMIDO, MODIFICADO E INTERVIDO POR NÓS

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1 Fracção do exército vermelho, organização alemã criada na Europa nos anos 70 quando se colocava a necessidade no movimento operário e estudantil da luta armada como estratégia revolucionária para vencer o sistema Imperialista-Capitalista.

2 Palavras de Pedro Rosas, ex-preso político.

3 María Emilia Tijoux, socióloga, deu aulas no CAS.

4 María Emilia Tijoux.

5 idem